Licenciamento ambiental parece um daqueles fantasmas burocráticos criados pela nossa máquina de produzir fantasmas no cerne de atividade legislativa, mas neste caso em específico, o licenciamento ambiental é parte de um conjunto fundamental que integra a legislação ambiental, algo imprescindível em nossa realidade.
O meio-ambiente tem sido vítima histórica da falta de cuidados e de responsabilidade por parte da humanidade, e não é só no Brasil.
Toda a história da evolução humana se construiu sobre uma base de descuido com as questões ambientais.
Claro que, no início, éramos tão poucos e nossas ações tão primordiais, que nosso impacto no ambiente era quase nada ou imperceptível.
Ocorre que nosso desenvolvimento, primeiro na quantidade de habitantes, num planeta preparado para receber em torno de 4 ou 5 bilhões de pessoas, onde temos quase o dobro.
Outro fator importante é o desenvolvimento tecnológico, que permitiu descobrir que os recursos naturais e minerais podem ser processados, cada vez em mais larga escala, resultando em produtos cada vez mais cobiçados por uma quantidade cada vez maior de gente.
O resultado é que viramos nosso foco para atividades exploratórias dos recursos naturais com voracidade, e se não tivermos uma legislação ambiental rigorosa e combativa, é provável que nossa amada espécie consuma tudo o que existe, transformando a Terra num gigantesco queijo suíço a orbitar o sol.
Licenciamento ambiental é a ferramenta de padronização de comportamentos
Licenciamento ambiental é, antes de tudo, um elemento de prevenção, pois se apoia no histórico da relação humana com o ambiente para antever caminhos possíveis para liberar atividades de contato e influência direta do homem sobre o meio.
O licenciamento ambiental atua em muitas esferas, mas o foco principal está conectado às atividades potencialmente poluidoras e degradantes ambientais.
O licenciamento ambiental é amparado pela Lei 6.938/1981, que estabelece a Política Nacional do Meio-Ambiente, o Sistema Nacional do Meio-Ambiente e institui o Cadastro de Defesa Ambiental.
Mesmo antes da promulgação desta legislação federal específica, já existiam iniciativas legais em âmbitos estaduais, praticadas desde o início da década de 70.
O licenciamento ambiental é prerrogativa obrigatória para a execução de qualquer tipo de atividade que exerça interação com o ambiente, com potencial de poluição ou degradação, em qualquer nível.
Embora esteja nominado como licenciamento ambiental, o conjunto legal também está atento aos impactos na saúde humana, a fauna e a flora local.
De qualquer forma, o que é potencialmente sensível do ponto de vista ambiental também está expresso em lei, a partir da Resolução CONAMA (Conselho Nacional do Meio-Ambiente) 237/1997, que elenca quais são as atividades potencialmente agressivas ao ambiente.
A mineração, obviamente, é peça central neste tabuleiro, já que a essência da atividade prevê incursões de todos os tipos e em variados níveis no meio-ambiente.
A construção civil é outra atividade humana muito focada dentro dos conceitos de proteção ambiental, já que também altera o meio para inserir o resultado de sua ação.
Os níveis de impacto
É compreensível que as diferentes atividades possuam diferentes potenciais de impacto sobre o ambiente, o que fez a lei diversificar estes níveis, considerando grupos de atividades de ALTO, MÉDIO e BAIXO impactos ambientais.
Outro fator determinante, além das características da atividade, são as dimensões do empreendimento, já que uma atividade de baixo impacto, por exemplo, exercida numa grande área territorial, tende a resultar, no conjunto da obra, num grande impacto global ao ambiente.
Isto cria variáveis de avaliação.
No caso da mineração, a classificação trafega por todos os níveis da escala de impacto, dependendo do tipo de operação a ser executada e as técnicas aplicadas.
O método de lavra é determinante para a classificação entre baixo, médio ou alto impacto ambiental na atividade mineradora.
O conjunto de informações avaliado no licenciamento ambiental de uma mineração envolve o método de lavra, a magnitude da área a ser impactada, a presença ou não de beneficiamento e o tipo técnico utilizado para beneficiar minérios, a existência de barragens de alimentação do processo ou de armazenamento de rejeitos, bem como depósitos ou pilhas de resíduos da atividade.
Tudo isto é avaliado, considerando também a relevância do lugar onde se localizará o empreendimento e seu contexto ambiental.
Porque o licenciamento ambiental é importante
O licenciamento ambiental é uma espécie de certificação prévia de que aquele projeto não impactará o ambiente em condições que vão além do que aquele nicho é capaz de suportar, sem comprometer existencialmente o lugar, seus ecossistemas e ambientes.
O licenciamento ambiental também prevê as condições de recuperação dos locais impactados, dos recursos naturais, vitais e ambientais, tudo o que, de alguma maneira, tenha sofrido alterações quando da implementação do empreendimento, tudo considerando um equilíbrio e a consciência razoável para atender a todos os interesses, com foco primordial na proteção ambiental.
O equilíbrio e o bom-senso norteiam as relações de deliberação sobre os aspectos de licenciamento ambiental, seus agentes reguladores e de fiscalização e os empreendedores interessados na atividade fim.
O objetivo fundamental é que as atividades possam ser exercidas com segurança e viabilidade, respeitando sempre os regramentos e políticas ambientais pertinentes.
O licenciamento ambiental e a fiscalização
O conjunto legal que cuida do licenciamento ambiental é controlado pelo CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que assessora, estuda e propõe ao Governo Federal os aspectos ligados às diretrizes e políticas ambientais.
O objetivo de tudo é o equilíbrio entre as operações de exploração e transformação ambiental com a qualidade de vida dos lugares e seus ecossistemas.
O poder de fiscalização e controle é estendido aos Estados e Municípios, que possuem estruturas próprias para realizar a fiscalização do cumprimento das diretrizes determinadas em lei, além das políticas ambientais determinadas no âmbito Federal, Estadual e Municipal.
No Rio Grande do Sul, por exemplo, esta atividade reguladora e fiscalizadora é realizada pela FEPAM (Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler), apoiada tecnicamente pelo CONSEMA (Conselho Estadual do Meio-Ambiente), que personaliza os aspectos legais ao contexto do estado Gaúcho.
Quais as penalidades para quem descumpre as legislações ambientais
Toda lei tem a característica de possuir penalidades dimensionadas à muitas variáveis, como o grau da infração, sua abrangência, o próprio impacto direto e indireto causado, os prejuízos decorrentes daquela ação ilegal, e muitas outras, todas relacionadas com a magnitude e gravidade do fato.
Com a legislação ambiental não é diferente.
O marco regulador básico das penalizações é a Lei 9.605/1998 que considera de forma abrangente o que é relevante para o cumprimento da lei e o que deve ser considerado como penalização para quem descumprir o que é determinado.
Num primeiro momento a Lei demonstra que praticamente todos os envolvidos, direta ou indiretamente com a operação considerada ilegal poderão ser punidos de alguma forma e em alguma proporção.
No seu Artigo 2º a Lei específica claramente que o impacto punitivo pode se dar sobre a empresa como ente jurídico, os diretores responsáveis e ainda, “o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.”
Ainda dentro da Lei o seu Artigo 6º fala do que a autoridade julgadora considera na definição da pena e quais são os modelos penais aplicáveis:
- 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
- I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
- II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
- III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
O artigo 7º prevê um formato de restrição de direitos, em substituição à privação de liberdade e em que condições elas são aplicáveis:
- 7º As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando:
- I – tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos;
- II – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime.
- Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída.
O Artigo 8º relaciona as penas restritivas:
- 8º As penas restritivas de direito são:
- I – prestação de serviços à comunidade;
- II – interdição temporária de direitos;
- III – suspensão parcial ou total de atividades;
- IV – prestação pecuniária;
- V – recolhimento domiciliar.
Vários outros tipos penais são especificados pela Lei 9.605/1998 e nestes outros tipos penais se inserem os modelos de penalizados privativas de liberdade, que são variáveis e são apresentadas de forma objetiva em cada um dos artigos relacionados aos tipos penais.
Existem penalidades que envolvem a suspensão de atividades, multas simples ou diárias, perda de benefícios e incentivos fiscais, indo até a privação de liberdade.
O crime ambiental já é tipificado objetivamente no sistema legal brasileiro.
É recomendada uma análise sobre o texto da Lei, que é de simples compreensão e demonstra como esta legislação procurou focar no que é realmente impactante na relação entre a atividade humana e a proteção ambiental.
Quais os profissionais envolvidos no processo de licenciamento ambiental
Do ponto de vista técnico são vários e podem ser muitos, tudo depende do caso e do tipo de operação a ser licenciada.
Existem dois lados na moeda do licenciamento ambiental.
De um lado temos a operação por parte da empresa, que precisará criar o projeto, avalizá-lo tecnicamente, criar os documentos principais e de apoio requeridos pelo órgão responsável pelo licenciamento ambiental, respeitando os aspectos técnicos e legais envolvidos num processo deste formato.
Na empresa é comum ser necessária a presença de engenheiros de minas, geólogos, técnicos em mineração, engenheiros civis e avançando para outras especialidades, mais conectadas com o mercado, para os estudos de viabilidade econômica e de gestão dos recursos e gerenciamento do projeto, além de eventualmente ser necessária a presença de profissionais do direito ambiental, para embasar tecnicamente e legalmente os projetos apresentados ao órgão deliberativo.
Do ponto de vista da instituição deliberativa, não é muito diferente, pois a autarquia vai precisar de engenheiros de minas, geólogos, técnicos ambientais, pessoal do jurídico e uma malha administrativa para avaliar os projetos sobre todos os pontos-de-vista, antes de se pronunciar sobre o licenciamento ambiental.
Do ponto de vista técnico, são estes os atores principais deste enredo, mas também são comuns as presenças de profissionais ambientalistas, como biólogos, que controlam os impactos sobre as espécies ali existentes, engenheiros ambientais, que cuidam dos ecossistemas de forma mais abrangente, englobando a fauna, agrônomos, engenheiros florestais.
Também não é incomum o envolvimento de profissionais mais específicos ainda, como geógrafos, topógrafos, químicos, químicos industriais e tantos outros.
Tudo depende de cada caso e suas particularidades.
O que tem se convencionado utilizar, em função da enorme economia oferecida, além do grande diferencial técnico envolvido, é a contratação de empresas especializadas em soluções completas para empreendimentos que necessitam do licenciamento ambiental.
Estas empresas realmente especializadas (não as que se aventuram no ramo), costumam ser uma solução não apenas nos processos que envolvem o licenciamento ambiental, mas costumam estar capacitadas a oferecer apoio jurídico específico sobre direito ambiental e mineral, apoio de técnicos e profissionais especializados em geologia, engenharia de minas, topografia, ecobatimetria, cartografia, biologia, engenharia ambiental e praticamente todas as atividades indispensáveis para empresas que atuam em segmentos tão invasivos do ponto de vista ambiental, e por isto, tão controlados e regulamentados.
Estas empresas costumam ser de 8 a 10 vezes mais baratas do que as opções de manter profissionais especializados dentro dos quadros das empresas e costumam oferecer muito maior eficiência, já que parte de seu papel principal, envolve a constante atualização técnica e legal, neste emaranhado complexo de leis e procedimentos.
Os requisitos para um licenciamento ambiental
Os requisitos necessários para um processo de licenciamento ambiental seguem, mais ou menos, o que expressamos na relação de profissionais envolvidos, pois a dinâmica de cada tipo de operação vai determinar, também, os requisitos legais para esta liberação.
Num caso de mineração, por exemplo, é necessária a anuência da Agência Nacional de Mineração (ANM), o que se dá através de um Título Minerário, que tem diferentes tipos de regime, mas que basicamente, autoriza e determina o direito daquele interessado sobre a área, os recursos e a exploração do que é pretendido naquele projeto.
A autorização de exploração por parte do superficiário (proprietário do terreno onde acontecerá a exploração) também é necessária no processo de liberação.
Normalmente, o que se busca inicialmente junto ao órgão responsável pela liberação, é uma relação denominada Termo de Referência, onde aquele órgão determina, para aquele caso em específico, o que precisa ser disponibilizado, em cada etapa, até a conclusão do processo, que culminará com o devido licenciamento ambiental, ou não.
Vamos falar sobre consciência ambiental
Licenciamento ambiental é um elemento humano, criado e desenvolvido por humanos, visando regrar a atividade humana com potencial de impacto sobre o meio ambiente.
Isto repete a sina de muitas outras atividades que precisam de regulação, pois sem este tipo de mecanismo, pessoas não teriam limites em suas buscas pelo atendimento de seus interesses, sobretudo os econômicos e relacionados ao poder.
Não estamos julgando a espécie humana, até porque é ineficaz, apenas constatando a necessidade de instrumentos como o licenciamento ambiental para regular a atividade humana e controlar os limites que impeçam a sua própria destruição.
Mais especificamente, ao que trata do meio-ambiente, o mal que eventualmente uma ação desregrada possa causar, não vai impactar apenas aquele grupo de pessoas ou aquela localidade em específico.
Atividades de impacto ambiental possuem inerente potencial de impactar a própria existência ambiental, a degradação do meio-ambiente é apenas a primeira das consequências diretas de atividades mal controladas, independente da existência ou não de dolo na sua execução.
Destruições ambientais de grande monta quase nunca podem ser recuperadas.
Derramamento de resíduos químicos no ambiente deixam sequelas que duram milhares de anos, gerações, portanto.
Ter consciência ambiental é seguir as leis, respeitar as regras e agir com humildade quando o assunto envolve o meio-ambiente, mas ter consciência ambiental de verdade, é saber, objetivamente, que mesmo se não existissem as leis, esta ou aquela atitude pode prejudicar o ambiente de todos nós.
Uma criança já pode ter consciência ambiental se for educada para isto, e simplesmente, não jogar o papel do doce no chão, pois entende o grau de agressão que aquele ato, sem intenção, pode causar.
Seria excelente se todos nós, antes das leis (que são indispensáveis), conseguíssemos a pureza de pensamento necessária para entender que o meio-ambiente é um ente passivo, até certo ponto, mas que a forma ativa de responder aos maus-tratos aos quais nós o expomos, pode ser definitiva, para a nossa própria existência.
Pense nisto!